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Berimbaus empunhados por jovens mulheres capoeiristas – ato político, artístico e musical – marcou a abertura oficial da 3ª edição do Festival de Capoeira: Ancestralidade e Resistência. Com o tema “O Futuro é Ancestral”, o evento retorna ao calendário cultural baiano com a proposta de resgate das raízes e com olhar atento para as novas gerações. A programação iniciou nesta quinta-feira (13) e se estende até o domingo (16), na Biblioteca Central do Estado da Bahia, em Salvador, com diversas atividades gratuitas para todos os públicos.

Com notável presença feminina, a “Cidade da Capoeira” recebeu a Orquestra de Berimbaus de Mulheres (Igbadu), liderada pela Mestra Janja, uma das maiores referências na luta pela equidade de gênero dentro e fora das rodas, e da cantora Juliana Ribeiro, que trouxe um repertório com canções que pautam a identidade negra.

Capoeirista, historiadora e ativista feminista e LGBTQIA+, Mestra Janja ressaltou a capoeira como um instrumento integrativo. Ela também venerou a ancestralidade, com homenagem ao Mestre Pastinha (1889-1981).“Nós juntamos atabaques e berimbaus para trazer as nossas necessidades e possibilidades de imprimirmos espaços criativos que tenham a nossa cara. Dedico essa apresentação ao Mestre Pastinha e a nossa juventude negra. ‘Eu vou dizer, pode crer, tem homem, mulher e LGBT’”, finalizou entoando uma cantiga inclusiva.

No espaço Moa do Katendê, quadrilátero da Biblioteca Central, a Monitora Delicada conduziu as ações de abertura do Festival que seguiram com instrumentações da Igbadu e Mestre Curió, discípulo de Pastinha e guardião dos saberes da Capoeira Angola; discurso-protesto narrado pelo Mestre Tonho Matéria contra a lei da vadiagem (que perseguiu e criminalizou capoeiristas no século passado); poesia falada com o trio feminino Slam das Minas; performances das capoeiristas Borboleta e Cantadora; intervenção musical de Gabi Guedes e show de encerramento da banda Sibidudu.

Ancestralidade e políticas públicas

Também esteve presente no evento a comitiva do Capoeira em Movimento Bahia (CMB) (realizadora do Festival) os Mestres e Mestras Griôs que estão sendo homenageados nessa edição, além dos representantes públicos das esferas municipais e estaduais.

Na figura de Jurandir Júnior (Jacaré DiAlabama), o CMB reforçou os esforços para pôr em prática mais uma edição do Festival de Capoeira e os desafios em propagar para os jovens a mensagem de preservação do legado construído até aqui.

“Cada Festival tem um significado. Nesse, a gente quer passar a magia da capoeira através daquilo que está dentro de nós, do que entendemos como ancestralidade, e o papel das novas gerações. O futuro é ancestral, e o desafio é conhecer cada vez mais nosso passado, para entender os desafios do presente e construir um futuro. O Festival também celebra uma das maiores conquistas após a retirada da capoeira do Código Penal Brasileiro e da sua inclusão com o patrimônio imaterial da humanidade: a capoeira nas escolas públicas, através da lei Moa do Katendê. Incentivar os nossos mais novos a respeitar tudo isso é o nosso desafio”, disse.

Autora do PL Moa do Katendê (14.134/2021), a deputada estadual Olívia Santana comemorou os avanços após a regulamentação da lei e destacou a coexistência entre gerações na capoeira. “A gente se emociona de ver Mestre Curió, com 88 anos, e ao mesmo tempo ver crianças jogando a capoeira nesta roda. Essas crianças que aqui estão significa a continuidade de todas as sementes que os senhores e senhoras plantaram e continuam plantando”.

Titular da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial, Ângela Guimarães também discursou no evento. “Nada melhor do que celebrar o mês da Consciência Negra com esse grande festival. Eu quero aqui reafirmar a importância dessa luta que nasce do chão das ruas, que bate em muitas portas, que chega a virar lei e que hoje possibilita que a gente esteja celebrando um conjunto de políticas públicas que reconhecem o devido valor e a importância da capoeira na formação da nação brasileira”.

O Secretário do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte da Bahia (SETRE), Augusto Vasconcelos, parabenizou a edição do Festival e fez duras críticas à gestão de Salvador por vetar a lei que prevê a inclusão da capoeira no currículo das escolas municipais, na qual foi autor em seu mandato de vereador. “Tomamos essa rasteira, mas como bons capoeiristas, voltamos pra roda. O projeto segue de pé pra gente lutar, reapresentá-lo, e, dessa vez, sancionar, para que vire lei na Câmara Municipal de Salvador.

Passado, presente e futuro da capoeira

Participaram da abertura diversos grupos e associações de capoeira e entidades culturais de todo o estado, como o Nação Capoeira, Gaviões da Lua, Tribo Unida, Arte Negra, Guerreiros de Palmares, Grupo Luanda, Dendê Maré e Angola é Vida. Para o Formado Fênix, o evento evidenciou o caráter transformador da capoeira. “O Festival tem grande importância para a juventude que aqui encontra a ancestralidade e preserva a capoeira. Muitos estão se perdendo, então conectar essa galera mais jovem com a galera mais antiga é muito bom”.

A jovem capoeirista Rafaela de Jesus, do Grupo Luanda, de Salvador, ingressou na capoeira ainda neste ano, mas já possui uma forte conexão com a arte-luta. Mãe de menino, ela diz passar os ensinamentos para o filho e fazer a roda ancestral girar.

“Eu sou nova na capoeira. Sou de Santo Amaro, e aqui em Salvador resolvi entrar. Eu vou para as aulas e levo meu pequeno comigo. Virou um parceiro de capoeira. Vejo futuro nele”, disse orgulhosa.

O “3º Festival de Capoeira Ancestralidade e Resistência: o futuro é ancestral” é uma realização do Capoeira em Movimento Bahia (CMB), através da Federação de Capoeira da Bahia (FCBa) e da União Comunidade em Movimento (UCM). O projeto conta com o patrocínio do Governo do Estado da Bahia, por meio da Setre/SUDESB, e da Bahiagás. Além do apoio institucional da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (SECULT), através da Fundação Pedro Calmon (FPC) e da Fundação Cultural do Estado da Bahia (FUNCEB), da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (SEPROMI) e da Salvaguarda da Capoeira da Bahia, e a parceria do Capoeira History.

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