“É na luta que a gente se encontra” foi o tema do 2° Encontro da Diversidade no Festival de Capoeira: Ancestralidade e Resistência. A mesa trouxe protagonismo para pessoas com deficiência, pessoas com obesidade, neuroatípicas e com condição neurodegenerativa que fazem da capoeira instrumento de inclusão e combate ao capacitismo. O evento aconteceu no Espaço Moa do Katendê e reuniu um grande público.
Com intermediação da Monitora Delicada, a mesa contou com o Mestre Gilson, Mestre Muralha, Mestre Pepino, Professor Gigante e Formada Preta Mari.
Nascido na Liberdade, em Salvador, e com 50 anos de capoeira, Mestre Gilson recebeu um diagnóstico de Parkinson há 15 anos, mas não deixou a doença lhe parar. Hoje atua com a Capoeira Adaptada, sendo uma das maiores referências na área, ajudando jovens e idosos através do esporte e da filosofia da capoeira.
“Eu consegui fazer do Parkinson o meu berimbau, o saber gingar, a régua e o compasso. O equilíbrio que a capoeira nos dá, em especial ao diagnosticado de Parkinson, é transformador na vida de qualquer pessoa. A doença que tenho é degenerativa, não tem cura. E convivendo 15 anos com esse diagnóstico, eu consegui fazer do gingado a minha conexão”, disse emocionado.

Um dos maiores exemplos de que a capoeira não está limitada a padrões de corpos, o Mestre Muralha, da Associação de Capoeira Ogunjá, trouxe toda a sua potência em sua fala.
“Eu nasci em 1989, sou o 11º filho, o único a seguir o legado do meu pai. Tenho 11 anos de Mestre, 33 anos de capoeira e 36 anos de idade. Sou preto, gordo e jogo capoeira, porque eu não estou aqui pra ser o sistema. Eu sempre falo que eu sou fora do esquadro. Eu consegui salvar vidas através da capoeira, e isso é o meu combustível”.

Professor na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Salvador (APAE), Mestre Pepino dá aulas para crianças e adolescentes com deficiência intelectual e autismo. Acompanhado dos seus alunos, o profissional destacou a importância da capoeira para o grupo.
“A sociedade é uma das grandes barreiras que a gente enfrenta, muitos não respeitam e integram indivíduos fora do padrão. E a capoeira vem com essa missão. As pessoas que estão lá tem muito entusiasmo e vontade de aprender, e o esporte tem sido transformador na vida delas”, disse.

Praticante de capoeira há 20 anos, Professor Gigante é uma pessoa com deficiência física desde o seu nascimento. Ele trouxe a importância da representatividade dentro da roda.
“A capoeira já é formada dentro da diversidade. E se falando em pessoa com deficiência, em pessoas com as suas diferenças corporais, vai ainda mais além do que a gente imagina. Apesar disso, ainda há pouca representatividade nesse espaço. Eu não fui inspirado por pessoa com deficiência na capoeira, minhas inspirações foram de pessoas sem deficiência. Mas lá na frente alguns alunos nessa condição vão olhar para trás e se espelhar em mim”, disse.

A Formada Preta Mari também compartilhou as suas vivências enquanto uma mulher preta e gorda na sociedade e na comunidade da capoeira. Ela frisou o efeito positivo causado quando grupos socialmente excluídos passam a ocupar espaços de destaque.
“Há um tempo eu tinha vergonha do meu corpo, eu achava que eu não conseguia fazer os movimentos e depois que tive referências muito próximas de mim, me fez abrir os olhos e compreender que eu também sou potência, que o meu corpo é potência e que eu consigo ocupar esses lugares também, sendo uma mulher gorda. Hoje muitas mulheres fora do padrão me procuram pra treinar. Certa vez uma delas me disse: ‘eu me identifiquei com você porque eu também sou gordinha. E eu nunca vi ninguém jogando capoeira com esse corpo’”, finalizou.

Acessibilidade também é papo de Capoeira
O Encontro da Diversidade, assim como todas as atividades oratórias do Festival de Capoeira, contou com intérpretes e tradutores em libras para garantir a comunicação e acesso à informação para pessoas surdas ou com deficiência auditiva. O intérprete Ronaldo Freitas parabenizou a ação.
“O surdo, assim como todas as pessoas, tem direito a ir em todos os espaços e ter as informações detalhadas. E a presença de um intérprete facilita essa comunicação, em que a pessoa vai ter mais conhecimento, mais informação e vai saber mais sobre a capoeira”.








