A manhã desta sexta-feira (14), segundo dia do Festival de Capoeira: Ancestralidade e Resistência, iniciou com a Roda de Conversa: O Futuro é Ancestral. A mesa foi composta por Jacaré DiAlabama, coordenador do CMB, a deputada estadual Olívia Santana, autora do PL Moa do Katendê, Dudu Rose, griô e músico senegalês e Mestre Jocilon, vice-presidente da Salvaguarda da Capoeira.
O debate foi permeado por vivências, estudos técnicos e sociais sobre a capoeira e estratégias de fomento de políticas públicas. A discussão foi aberta por Jacaré, que iniciou saudando todos os participantes, e trouxe em seu discurso os efeitos da regulamentação do estado da lei Moa do Katendê.
“Ano passado foi regulamentada a lei Moa do Katendê, que é um plano de salvaguarda da Capoeira, mas que prevê, entre outras coisas, a inclusão da capoeira nas escolas públicas do Estado da Bahia. E esse ano começou a sua implementação. Muitos aqui podem dizer: ‘poxa, mas a capoeira já está na escola, na minha comunidade’. O fundamental aqui é entender que nós não queremos entrar pelas portas dos fundos, nós não queremos aquele cantinho da sala de aula. A gente quer ter um espaço com dignidade. Nós queremos que o nossos Mestres e Mestras sejam reconhecidos como guardiões e guardiãs dessa ancestralidade. A segunda questão é que: a capoeira nas escolas, para nós, não é meramente uma atividade física. É, sobretudo, conhecimento. Para preservar e entendermos a nossa cultura, para garantir que o nosso povo tenha identidade cultural vinculada à sua história e formação”.

A deputada Olívia Santana endossou a importância da lei. “Está dentro da lei Moa do katendê tudo que a capoeira representa, ou pelo menos um recorte. Sou autora do projeto e fico muito feliz de ter esse instrumento provocado por Jacaré DiAlabama, que pegou essa pauta com as unhas, porque é assim que se faz uma luta coletiva. Mas ela é, também, resultado das responsabilidades individuais. É um movimento dialético entre um e outro”, disse a parlamentar.

O griô Dudu Rose veio de Senegal, país localizado no ocidente da África, para compartilhar a sua sabedoria ancestral no Festival de Capoeira. Através de contos, o Mestre narrou a sua história e a influência diaspórica na formação de sua identidade.
“Estou muito feliz de estar na Bahia e ver que ela não me esqueceu. Me sinto acolhido como a primeira vez que cheguei aqui. Sou de uma família griô, sou griô de sangue e osso. A minha família não tem outra coisa pra fazer além de arte: canto, dança e contar histórias”.

Vice-presidente da Salvaguarda, Mestre Jocilon chamou atenção da comunidade da capoeira em não se omitir nos processos de luta e resistência pela construção de um futuro melhor. “Por isso é importante a gente estar presente em eventos como o Festival de Capoeira. É uma experiência importantíssima do ponto de vista de ocupação de espaços. Entrar pela porta da frente nas escolas e falar de capoeira não são assuntos que devem ser discutidos apenas no mês da consciência negra, porque é assim que sempre foi no nosso estado. Então, não vamos deixar de fazer uma parte do nosso dever de casa, que é sentar para falar de políticas públicas”, finalizou o Mestre.

Contribuição dos povos originários na Capoeira e Lei da Bíblia nas Escolas
O debate trouxe luz a um tema ainda pouco discutido nas rodas: a visibilidade dos povos originários na capoeira. O capoeirista Jacarandá, liderança do povo Tupinambá em Olivença, sul do estado, destacou a forte contribuição indígena na arte-luta.
“Quando nosso companheiros chegaram escravizados, juntos com os nossos ancestrais indígenas, abrimos as matas e construímos a luta juntos, na mesma linha, um no rastro do outro, isso deve ser valorizado”.

A lei que autoriza o uso da Bíblia Sagrada como recurso paradidático em escolas públicas e particulares da capital baiana também foi pauta na discussão. O assunto foi trazido pela capoeirista e assistente social Jamile Soares, que direcionou a pergunta para Olívia Santana.
“O movimento tem que se posicionar, porque as escolas públicas não pode virar uma escola de determinada religião. Em caso disso, acionem o Ministério Público. Aqui não é a casa do prefeito, é a casa do povo”, respondeu a deputada.


